Bonde antigo no Rio |
Puxados
por burros, movidos a vapor e logo em seguida à energia elétrica, o bonde está
intimamente ligado a memória afetiva dos brasileiros. Mesmo aqueles que nunca
sentiram o leve chacoalhar nos trilhos e as sinetas do motorneiro sentem
saudade dessa época.
O mundo, e
principalmente os grandes centros urbanos, estão à procura de soluções que
permitam perder menos tempo nos infinitos e fumacentos congestionamentos de
carros vazios e ônibus mal distribuídos pela malha urbana. O Rio não difere
dessa realidade. Até quem nunca subiu nas linhas de bonde que aqui circulavam, pode
imaginar o quanto seria agradável se algumas ruas da cidade voltassem a receber
os trilhos e o passeio tranquilo do bom e velho bonde.
O primeiro
bonde a ser visto nas ruas do Rio de Janeiro atravessou a cidade puxado por
burricos em 1859. Pertencia à Companhia de Carris de Ferro da Cidade à
Boavista, que faliu sete anos mais tarde, em 1866. O serviço foi reinaugurado
em 1868 pela Companhia Botanical Garden Rail Road Company, tendo a bordo
como passageiro de luxo o Imperador Dom Pedro II e representou o início da
expansão das linhas para a zona sul e o subúrbio da cidade.
Muitas são
as curiosidades sobre esse charmoso meio de transporte. Atribui-se a origem da
palavra bonde à grande semelhança do termo inglês Bond = Título de
dívida. A época, o Barão de Itaboraí havia contraído um grande empréstimo com
títulos pagáveis em ouro. Coincidência ou não, pouco tempo depois dessa
operação, a Companhia Botanical Rail Road Company, gestora do serviço de
bonde, emitiu bilhetes de passagem com a inserção da palavra bond, o que
levou imediatamente a população a associação do Bonde aos bonds do
empréstimo do Barão de Itaboraí.
Grande
também é a contribuição da vida nos bondes para a cultura e o dicionário
popular. Quem nunca “comprou um bonde” (fazer mau negócio) ou “pegou o bonde
andando” (entrar no meio da conversa em andamento). Esses são alguns dos
jargões vivos até hoje no dia a dia dos brasileiros.
As linhas
de bonde do Rio de Janeiro, pertencentes à Cia. LIGHT desde 1910, começaram a
ser desativadas no início da década de 60. Quase 50
anos depois da desativação do sistema, algumas linhas ainda sobrevivem no
Brasil. É possível andar de bonde em São Paulo, Campos do Jordão, Campinas,
Belém, Santos e no Rio de Janeiro no bonde de Santa Tereza, o único que nunca
deixou de circular até o trágico acidente de 2011.
O caos que
vivemos nas grandes cidades, associado à gravíssima crise ambiental com a
queima de combustíveis fósseis e a baixa qualidade de vida nas metrópoles, nos
impõe algumas reflexões: a Prefeitura do Rio de Janeiro estuda o fechamento da
Av. Rio Branco ao tráfego de carros e ônibus, destinando exclusivamente o
espaço público ao passeio de pedestres e à circulação de bondes e demais
veículos elétricos, reordenando o fluxo dos veículos de transporte público para
grandes terminais rodoviários de referência.
Essa me parece uma boa medida para
acelerar o processo de revitalização do Centro, recuperando o charme perdido e
potencializando turisticamente esse espaço, o que gera recursos para o
município, além de contribuir positivamente para soluções ambientais criativas
com o uso de energia “limpa”.
Lisboa |
São Francisco |
Melbourne |
A discussão está colocada para o agora e para o futuro. Precisamos decidir sobre a qualidade de vida que queremos. Não só a ambiental, mas também a preservação da sanidade mental da nossa sociedade, enlouquecendo a passos largos com o estresse e a correria contra o tempo nas grandes cidades onde a vida vale muito pouco.
Pergunte a
alguém que conviveu e passeou nos bondes do Rio de Janeiro se os transportes
públicos melhoraram ou pioraram desde a desativação dos bondes, mesmo
considerando o megacrescimento populacional nesse período?
Não
podemos ter o preconceito de enxergar o bonde como algo que está
necessariamente associado à ideia de passado, de que “tempo bom é o que não
volta mais...” ou correremos o grande risco de perder o bonde certo para o
futuro.